sexta-feira, 24 de abril de 2009

Amo, Amas


Amar, amar, amar, amar siempre, con todo
el ser y con la tierra y con el cielo,
con lo claro del sol y lo obscuro del lodo.
Amar por toda ciencia y amar por todo anhelo.

Y cuando la montaña de la vida
nos sea dura y larga y alta y llena de abismos,
amar la inmensidad que es de amor encendida
¡y arder en la fusión de nuestros pechos mismos!

(Rubén Darío)

Esta Vida

Um sábio me dizia: esta existência,
não vale a angústia de viver. A ciência,
se fôssemos eternos, num transporte
de desespero inventaria a morte.
Uma célula orgânica aparece
no infinito do tempo. E vibra e cresce
e se desdobra e estala num segundo.
Homem, eis o que somos neste mundo.


Falou-me assim o sábio e eu comecei a ver
dentro da própria morte, o encanto de morrer.


Um monge me dizia: ó mocidade,
és relâmpago ao pé da eternidade!
Pensa: o tempo anda sempre e não repousa; 
esta vida não vale grande cousa.
Uma mulher que chora, um berço a um canto;
o riso, às vezes, quase sempre, um pranto.
Depois o mundo, a luta que intimida,
quatro círios acesos: eis a vida


Isto me disse o monge e eu continuei a ver
dentro da própria morte, o encanto de morrer.


Um pobre me dizia: para o pobre
a vida, é o pão e o andrajo vil que o cobre.
Deus, eu não creio nesta fantasia.
Deus me dá fome e sede a cada dia
mas nunca me deu pão, nem me deu água.
Deu-me a vergonha, a infâmia, a mágoa
de andar de porta em porta, esfarrapado.
Deu-me esta vida: um pão envenenado.


Assim falou-me o pobre e eu continuei a ver,
dentro da própria morte, o encanto de morrer.


Uma mulher me disse: vem comigo!
Fecha os olhos e sonha, meu amigo.
Sonha um lar, uma doce companheira
que queiras muito e que também te queira.
No telhado, um penacho de fumaça.
Cortinas muito brancas na vidraça
Um canário que canta na gaiola.
Que linda a vida lá por dentro rola!


Pela primeira vez eu comecei a ver,
dentro da própria vida, o encanto de viver.

(Guilherme de Almeida)

As Meninas

Foi há muito tempo, no Mediterrâneo, ou numa praia qualquer perdida na imensidão do Brasil? Apenas sei que havia sol e alguns banhistas; e apareceram duas meninas vestidas com vestidos compridos - o de uma era verde, o de outra era azul. Essas meninas estavam um pouco longe de mim; vi que a princípio apenas brincavam na espuma; depois, erguendo os vestidos até os joelhos, avançaram um pouco mais. Com certeza uma onda imprevista as molhou; elas riam muito, e agora tomavam banho de mar assim vestidas uma de azul, outra de verde. Uma devia ter 7 anos, a outra 9 ou 10; não sei quem eram, se eram irmãs; de longe eu não as via bem. Eram apenas duas meninas vestidas de cores marinhas brincando no mar; e isso era alegre e tinha uma beleza ingênua e imprevista. 
Por que ressuscita dentro de mim essa imagem, essa manhã? Foi um momento apenas. Havia muita luz, e um vento. Eu estava de pé na praia. Podia ser um momento feliz, e em si mesmo talvez fosse; e aquele singelo quadro de beleza me fez bem; mas uma fina, indefinível angústia me vem misturada com essa lembrança. O vestido verde, o vestido azul, as duas meninas rindo, saltando com seus vestidos colados ao corpo, brilhando ao sol; o vento... 
Eu devia estar triste quando vi as meninas, mas deixei um pouco minha tristeza para mirar com um sorriso a sua graça e a sua felicidade. Senti talvez necessidade de mostrar a alguém: "veja, aquelas duas meninas..." Mostrar à toa; ou, quem sabe, para repartir aquele instante de beleza como quem reparte um pão, ou um cacho de uvas em sinal de estima e de simplicidade; em sinal de comunhão; ou talvez para disfarçar a minha silenciosa angústia. 
Não era uma angústia dolorosa; era leve, quase suave. Como se eu tivesse de repente o sentimento vivo de que aquele momento luminoso era precário e fugaz; a grossa tristeza da vida, com seu gosto de solidão, subiu um instante dentro de mim, para me lembrar que eu devia ser feliz naquele momento, pois aquele momento ia passar. Foi talvez para fixá-lo, de algum modo, que pedi a ajuda de uma pessoa amiga; ou talvez eu quisesse dizer alguma coisa a essa pessoa e apenas lhe soubesse dizer: "veja aquelas duas meninas..." 
E as meninas riam brincando no mar.

(Rubem Braga)

Elegia Urbana


Rádios. Tevês.
Gooooooooooooooooooooooooooolo!
(O domingo é um cachorro escondido debaixo da cama.)

(Mário Quintana)


Grey Fox

"For a walk and back again", said 
the fox. "Will you come with me? 
I'll take you on my back. For a
walk and back again."

(Grey Fox, estória para meninos)
[in Sagarana, J.G. Rosa]

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Quadrante

Quadrante era o programa que Paulo Autran tinha no rádio. Certamente o programa mais genial de que já ouvi falar. Simples, às vezes não chegava a um minuto de duração, mas genial. Um poema, uma crônica, uma história falada.
Nunca de fato ouvi no rádio o programa, que era transmitido pela Rádio MEC na década de 50 e 50 anos depois foi retomado na Rádio Band News, no mesmo ano de sua morte. Mas aos poucos vou achando alguns MP3, um aqui outro ali, e me delicio com essas descobertas.

Agora que tenho já 72 "episódios" do programa aqui na minha biblioteca, resolvi organizar e colocar tudo num grande ZIP. Divirtam-se :)

Conteúdo do arquivo:
- Anúncio de João Alves, Cena Carioca, O Índio, Luzia, Quero Me Casar, Notícias Amorosas, A Corrente, Balada do Amor Através das Idades, Cruz, O Outro Nome do Verde, Poema de Sete Faces, Tentativa, Debaixo da Ponte, Le Voyeur, Lira do Amor Romântico e O Principezinho, de Carlos Drummond de Andrade;
- Poema em Linha Reta, Tabacaria, Pecado Original, Esta Velha Angústia e Sim Sou Eu Eu Mesmo, de Fernando Pessoa;
- Regininha ou Os Três Dias do Condor, Uma Surpresa Para Daphne, As Festas, O Reencontro, A Última Conseqüência, Crônicas de Verão, Isabel e Gin Tônica, de Luis Fernando Veríssimo;
- Canção do Suicida, Canção do Charco, Pequena Crônica Policial, Velha História, Canção do Amor Imprevisto e Canção de Bar, de Mário Quintana;
- Casamento, de Adélia Prado;
- Retrato, Chuva com Lembranças, Saudade da Ilha do Nanja, História de Bem-Te-Vis, O Estranho Mundo de Hoje, O Anjinho Deitado, O Mundo dos Manequins e Das Idéias, de Cecília Meirelles;
- Férias Conjugais, Achando o Amor, Dentro da Noite e O Retrato, de Paulo Mendes Campos;
- Fiat Lux, Fonte, Perguntar Não Ofende, Sem Maracas e Evidência, de Fernando Moreira Salles;
- Festa de Aniversário, Fuga, Banco de Rua, Entrevista de Televisão e A Mulher Vestida, de Fernando Sabino;
- Já Não Se Fazem Mais Bandidos Como Antigamente, de Rachel de Queiroz;
- A Valsa, de Casimiro de Abreu;
- A Flor do Maracujá, de Fagundes Varela;
- Sugestões do Crepúsculo, de Vicente de Carvalho;
- O Apanhador de Desperdícios, de Manoel de Barros;
- O Compadre Pobre, Resposta a Uma Certa Missiva, Duas Meninas e o Mar e Arnaldo Estrela Cronista, de Rubem Braga;
- Trem de Alagoas, Toré e O Verde, de Ascenso Ferreira;
- Paroquisa Estende a Mão e História de Mineiro, de Dinah Silveira de Queiroz;
- A Partida, de Augusto Frederico Schmidt;
- Rosa e o Subconsciente, Carnavais de Outrora, Visita e Chuchu, de Manuel Bandeira;
- Soneto de Separação e Soneto de Fidelidade, de Vinicius de Moraes;
- Ismália, de Alphonsus de Guimaraens;
- Come Meu Filho, de Clarice Lispector;

De João Guimarães Rosa

Luar

De brejo em brejo,
os sapos avisam:
- A lua surgiu!...

No alto da noite as estrelinhas piscam,
puxando fios,
e dançam nos fios
cachos de poetas.

A lua madura
rola, desprendida,
por entre os musgos
das nuvens brancas...
Quem a colheu,
quem a arrancou
do caule longo
da Via-Láctea?...

Desliza solta....

Se lhe estenderes
tuas mãos brancas,
ela cairá...